terça-feira, 29 de abril de 2014

O preço da ambição

   Durante o treino surgiu um assunto que só veio fortalecer a minha crença de que karate e vida são uma e a mesma coisa. O objectivo do exercício era estarmos em kiba-dachi (posição do cavaleiro) e lançarmos um tsuki (soco) para a frente o mais longe que conseguíssemos. E o curioso foi descobrir que se quiséssemos chegar o mais longe possível teríamos que nos inclinar para a frente, sacrificando assim algo importantíssimo: a nossa verticalidade, a própria ligação com o céu, aquilo que faz de nós humanos.
   Se virem uma pessoa curvada ou uma pessoa direita, sabem logo qual tem a postura mais correcta, e a ela associaram virtudes tais como nobreza, bondade, cortesia, disponibilidade... São essas virtudes que perdemos se nos desequilibramos para a frente porque achamos que a única coisa que importa é chegar mais longe.

Posição das pernas: Kiba-dachi


segunda-feira, 28 de abril de 2014

Viagem a um dojo diferente

   No outro dia fui treinar a um dojo diferente. O estilo era o mesmo e já conhecia o mestre, mas tudo o resto foi diferente. Sem querer simplificar o que não pode ser simplificado, foi como provar um bolo conhecido feito com uma receita diferente. Os ingredientes são outros mas a ideia é a mesma. E ver uma receita nova foi mesmo muito enriquecedor. Cada aluno tem uma cor, uma nota musical, um sabor diferente, e apesar de saber que só o facto de estar lá mudei um pouco a receita original, gostei imenso do que encontrei.
   Talvez esteja a dizer um grande disparate mas acho que assistir uma vez por outra a uma aula de outro mestre seja uma experiência boa e aconselhável. Talvez não no início, em cinto branco, amarelo ou verde, mas lá mais para a frente, porque não? Acho que treinar sempre com o mesmo mestre é muito bom, cria-se um laço fortíssimo entre mestre e discípulo, ele sabe as nossas manias, onde erramos, onde somos mais fortes, consegue desafiar-nos justamente onde e quando precisamos, mas com essa proximidade surge também algo mais - uma certa habituação. Por mais correcta, justa e bem intencionada que seja uma mensagem, se a ouvirmos repetida mil vezes acabamos por ficar resistentes a ela. Mas se essa mesma mensagem for enviada por uma pessoa diferente, parece ganhar um impacto maior. "Ah, se esta pessoa diz o mesmo que o meu mestre então é porque deve ser mesmo verdade." Não é justo para o nosso mestre, aquele que teve o trabalho de repetir mil vezes a mesma coisa, mas infelizmente acho que é assim que costuma ser.
   Mas também sou da opinião que esta viagem deve ser feita com bastante calma e serenidade. Felizmente que não me aconteceu, mas imagino que deve ser muito constrangedor estar num treino guiado por alguém que começa a insistir para passarmos a fazer algo que o nosso verdadeiro mestre sempre nos disse para não fazermos.

   Viajar é bom, abre-nos os olhos para novos horizontes, mas temos que ter uma Casa a onde regressar. Sem ela vamos andar perdidos, sempre a mudar, sem nunca encontrarmos uma forma à qual possamos chamar nossa.


sexta-feira, 25 de abril de 2014

O caminho é para cima


   Isto é karate:


   Fascina-me que possa existir algo que une todas as formas de estar na vida. Quer seja pelo caminho da arte, da ciência, da política ou da economia; em Portugal, na Índia ou na Argentina; agora, no passado e no futuro; lá bem no fundo todos procuramos o mesmo: uma forma de estar harmoniosa, justa e repleta de amor, de descobrimento e partilha. Se esta busca comum não é prova da existência da mesma alma dentro de cada um de nós, então não sei o que será.


quinta-feira, 24 de abril de 2014

Desafios

   A vida está feita de uma forma curiosa. O copo está sempre mais longe do que nós achamos que conseguimos chegar; e ter mais sede não faz o braço esticar. Achamos que está demasiado longe, ou que afinal já não temos sede, ou até que o copo nem sequer existe; somos capazes de arranjar mil desculpas para evitar o possível fracasso, mas a verdade é que o copo continua lá. Se fosse fácil chegar-lhe, a água não saciaria a sede, mas se fosse impossivelmente difícil, talvez morrêssemos ressequidos por nunca o conseguirmos alcançar. É por isso que ele está ali, nem demasiado perto nem demasiado longe, para nos obrigar a esticar o máximo que pudermos e depois mais um pouco, porque é dessa forma que a alma evolui, e nós redescobrimos aquilo que sempre fomos.


terça-feira, 22 de abril de 2014

Exame

   Hoje foi dia de exame.
  Acordar cedo, como sempre, mas a ansiedade era outra. Toda a gente nervosa, sem saber o que dizer. Alinhar, saudação, baixar para seiza. Contar os pares e perceber com quem vamos ficar. Será bom? Será mau? Será que interessa? Ser chamado lá para a frente. O dojo parece enorme. Estão todos a olhar. Há máquinas fotográficas à espera. Pedem-nos uma técnica. Chudan o'tsuki. Saímos o melhor que podemos. O chão agarra, a respiração está incerta. Calma, calma. Calma. A mão sai sozinha e o corpo vai atrás. Calma. Sem pressas. Outro ataque, outra vida. Calma, tu sabes fazer isto. Mais um ataque, e virar para trás. Está a correr bem. Só mais um pouco. Só até à parede. Respira fundo. Mais uma técnica. Não é assim tão difícil. Já fizeste isto mil vezes nos treinos. E depois outra. Está a correr bem. Sentar e ficar nervoso pelos outros. Respirar fundo para ver se eles se acalmam. Ver os nossos erros neles. A confiança passar a dúvida. Será que correu realmente bem? O júri parece animado.
   Ser chamado para o kumite. Saudação. Baixar olhar respirar. Atacar devagar. O corpo reconhece os movimentos. Desta vez mais rápido, mais solto, mais fácil. Atravessar o oponente com o olhar. Achar que está a correr bem e vir o mestre dizer que nos esquecemos do contra-ataque...! Defender uma, duas, três vezes. Afinal não está bem. O mestre diz que não estamos a atacar com tudo o que temos, e claro que tem razão. "É preciso vir até aqui" diz enquanto estica a mão muito atrás do oponente. "Ir até aí? Então está bem." E assim começa o verdadeiro kumite, aquele onde as barreiras caiem e as almas podem compreender-se através do corpo. Não é preciso palavras, a linguagem aqui é outra.
   E depois a kata. A atitude é aquela, os movimentos estão lá. Sentir pequenas falhas mas a vontade de continuar faz-nos sempre passar por cima delas. E terminou. Saudação para o oponente que somos nós, saudação para o júri que nos ajudou tanto.

   Obrigado por tudo. E até já.



segunda-feira, 21 de abril de 2014

Niju Kun: Os 20 princípios do Karate

   A ideia para o post de hoje já mudou tantas vezes que a descrição do seu percurso dava por si só um post novo. Inicialmente quis comparar o Shotokai com outros estilos de karate, mas quanto mais lia, mais percebia que não sabia o suficiente sobre os outros estilos para lhes fazer justiça . Mas ao menos podia escrever sobre o que definia o Shotokai, o que aprendi nas aulas devia ser suficiente, mas até aí encontrei grandes dificuldades. Cada palavra que usava limitava a importância do que queria transmitir. Mas desistir perante uma adversidade seria uma forma muito pouco "karatesca" de agir. Se queria falar dos princípios do Shotokai, então quem melhor para me ajudar que Gishin Funakoshi, o fundador do karate moderno?

Os vinte princípios do karaté assim como Gishin Funakoshi os escreveu.

   Infelizmente ainda não sei o suficiente de Japonês para perceber o que o mestre escreveu por isso tive que recorrer à tradução em inglês que outros fizeram. O que quero dizer é que quem conta um conto acrescenta um ponto, e embora a intenção seja boa, há sempre algo que fica diferente. Gostava que a mensagem continuasse a mesma. Longe de mim querer alterar algo que mal compreendo.


1. O karate começa e acaba com respeito.
一、空手道は礼に始まり礼に終る事を忘るな
Hitotsu, karate-do wa rei ni hajimari rei ni owaru koto o wasuru na


2. Não existe primeiro ataque no karate.
一、空手に先手なし
Hitotsu, karate ni sente nashi


3. O karate está do lado da justiça.
一、空手は義の補け
Hitotsu, karate wa, gi no tasuke


4. Conhece-te antes de conheceres os outros.
一、先づ自己を知れ而して他を知れ
Hitotsu, mazu onore o shire, shikashite ta o shire


5. A mente acima da técnica.
一、技術より心術
Hitotsu, gijitsu yori shinjitsu


6. O coração tem de ser libertado.
一、心は放たん事を要す
Hitotsu, kokoro wa hanatan koto o yosu


7. Calamidade nasce do descuido.
一、禍は懈怠に生ず
Hitotsu, wazawai wa ketai ni seizu


8. Karate vai além do dojo.
一、道場のみの空手と思ふな
Hitotsu, dojo nomino karate to omou na


9. Karate é uma busca vitalícia.
一、空手の修業は一生である
Hitotsu, karate-do no shugyo wa isssho de aru


10. Aplica o karate em tudo. Aí reside a sua beleza.
一、凡ゆるものを空手化せよ其処に妙味あり
Hitotsu, ara yuru mono o karateka seyo; sokoni myomi ari


11. Karate é como água a ferver; sem calor volta a ficar tépida.
一、空手は湯の如し絶えず熱度を与えざれば元の水に還る
Hitotsu, karate Wa Yu No Gotoku Taezu Netsu O Atae Zareba Motono Mizuni Kaeru


12. Não penses em ganhar. Pensa antes em não perder.
一、勝つ考は持つな負けぬ考は必要
Hitotsu, katsu kangae wa motsuna; makenu kangae wa hitsuyo


13. Ajusta-te ao teu oponente.
一、敵に因って轉化せよ
Hitotsu, tekki ni yotte tenka seyo


14. O resultado da batalha depende de como lidas com relaxamento e força.
一、戦は虚実の操縦如何に在り
Hitotsu, tattakai wa kyo-jitsu no soju ikan ni ari


15. Pensa nas tuas mãos e pés como espadas.
一、人の手足を剣と思へ
Hitotsu, hi to no te-ashi wa ken to omoe


16. Quando deixas a segurança da casa enfrentas milhões de inimigos.
一、男子門を出づれば百万の敵あり
Hitotsu, danshi mon o izureba hyakuman no teki ari


17. Posturas formais são para principiantes; depois deve-se estar naturalmente.
一、構は初心者に後は自然体
Hitotsu, kamae wa shoshinsha ni atowa shizentai


18. A kata deve ser sempre praticada correctamente: combate real é diferente.
一、形は正しく実戦は別物
Hitotsu, kata wa tadashiku, jisen wa betsumono


19. Não esquecer a aplicação ou remoção de poder, a extensão ou contracção do corpo, a aplicação rápida e descontraída da técnica.
一、力の強弱体の伸縮技の緩急を忘るな
Hitotsu, chikara no kyojaku tai no shinshuku waza no kankyu


20. Sê cuidadoso, diligente e engenhoso na tua busca do caminho.
一、常に思念工夫せよ
Hitotsu, tsune ni shinen ku fu seyo


   Cada um destes princípios merece um livro para o aprofundar mas, por agora, é o melhor que consigo fazer. Talvez da próxima já saiba o suficiente para os poder desenvolver mais um pouco.

Gishin Funakoshi, o fundador do Karate moderno.

sábado, 19 de abril de 2014

Irimi

   Existe uma técnica no Shotokai que parece desafiar toda a compreensão. O irimi consiste na capacidade de prever quando e onde o oponente vai atacar, permitindo assim bloqueá-lo antes de ele atacar. Pois, eu sei que parece ridículo mas garanto-vos que a realidade é ainda mais estranha. Enfrentar alguém com esta técnica aperfeiçoada é das experiências mais estranhas que já vivi. Estou eu ali muito bem em posição zenkutsu dachi, pronto para sair para o ataque; estou calmo, respiro normalmente, os pássaros cantam, os meus colegas estão todos a olhar, relaxo os ombros, sereno a mente, e no preciso instante em que o meu cérebro dá ordem para os músculos se contraírem, vejo o meu oponente a avançar contra mim a uma velocidade absurda. Nesse instante a ordem do cérebro chega aos músculos e eu começo a mexer-me, mas é tarde demais, ele já lá está, e bloqueia-me a mão antes mesmo de ela ganhar velocidade. Rapidamente penso que alguma coisa deve ter revelado a minha intenção. Que essa é a única "explicação científica" para o que acabei de presenciar. Volto a pôr-me em posição, e sem dar qualquer tempo para revelar as minhas intenções, saio novamente, mas ele já lá está, sempre primeiro que eu.

   Estava eu muito bem no estágio da aroeira e o desafio que nos foi lançado foi o seguinte: fechem os olhos, sintam quando é que o vosso oponente vai atacar, e só nesse instante voltem a abrir os olhos e avancem para receber o ataque. Ora bem, eu fechei os olhos prontamente e foi com um certo pânico que descobri que com o vento e as ondas do mar era impossível ouvir quando é que o meu oponente ia sair. Falhei uma, duas, três, quatro vezes, mas um dos mestres deve ter sentido a minha frustração porque se aproximou para me dizer que eu tinha que confiar na minha intuição porque ela nunca se enganava, e que essa era a única maneira de saber quando devia avançar. Eu fechei novamente os olhos, inspirei fundo, e quando achei que talvez fosse uma boa altura para sair, não saí, aguardei mais um pouco, e pensei que estava a demorar demasiado, mas esperei ainda mais... até que todas as vozes se calaram, e foi aí, nesse breve instante de silêncio, que ouvi um pequeno murmúrio assegurando-me que aquela era a altura certa para sair. Abri os olhos, avancei para o ataque, e vi o meu oponente a sair ao mesmo tempo, tal como era suposto acontecer.


   Uma vez um homem fantástico disse-me uma frase que nunca esquecerei. "O corpo é a sombra da força." E a forma como eu interpretei isto foi que as coisas acontecem antes de se manifestarem, e só quando se manifestam é que os nossos sentidos as conseguem registar, mas existe em nós algo que pertence a um domínio mais profundo e misterioso, e é nesse domínio que os acontecimentos realmente começam.

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Força, perseverança e outras coisas invisíveis

   No início estranhava quando os mestres diziam que esta ou aquela pessoa estava muito forte porque a imagem que eu criava raramente correspondia ao que os olhos viam. Como é que podia ser forte se era demasiado nova, ou demasiado velha, ou demasiado gorda, ou demasiado magra? Podia, claro, porque a verdadeira força não vem dos músculos agarrados aos ossos mas de algo muitíssimo mais misterioso. Se querem saber o que é verdadeira força então vejam alguém treinar horas sem parar, a pingar de suor, pálido como tudo, pernas a tremer de uma lesão antiga, mas por se recusar a desistir, continua sempre, mais forte que nunca.

E se à força aliarmos a perseverança?

   A verdadeira força é mental, e só ela pode vencer o combate antes mesmo de ele começar. Se duvidam, então olhem nos olhos de alguém que, embora pareça sereno, está a rosnar por dentro. Como o dragão que aguarda pacientemente pela oportunidade certa para atacar, também essas pessoas emanam uma força assustadora. Os nossos olhos podem enganar-se mas o nosso coração não, e só temos que lhe prestar atenção para sabermos que é verdade.

   Verdadeira força é superar os limites que nos foram impostos e ir muito além deles.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Encarar o infinito

   Se há coisa que depressa se descobre no karate é que os nossos olhos são mais um obstáculo que outra coisa. Confiamos demasiado neles quando olhamos para o chão enquanto treinamos, para as pernas para ver se estão na posição certa, para o oponente para saber quando devemos sair para a defesa, mas o problema dos olhos é que eles gostam de se focar num único ponto, e o nosso verdadeiro alvo está no infinito.

Caminhar sempre em direcção ao infinito

   A limitação da visão acontece não só no combate mas em tudo o resto. Se estamos a fazer alongamentos e quisermos chegar até aos pés, o mais provável é um dia conseguirmos lá chegar, e nesse dia agarramo-nos a eles com toda a força pensando que finalmente conseguimos - apesar de continuarmos apenas ali, agarrados aos pés. Pelo contrário, se o nosso objectivo não for os pés, nem sequer a parede, mas uma imagem mental infinitamente mais longe, então nunca nos contentaremos em chegar apenas aos pés, e estaremos sempre a tentar chegar mais longe. Acho que saber viver com esse "caminhar eterno sem nunca chegar ao destino porque o que importa é o caminho" é uma das coisas que mais me atrai no karate. O dia em que chegar ao dojo e a minha mestra me disser que cheguei ao fim do caminho, que já sei tudo o que há para saber e que não tenho mais nada para melhorar, será um dos dias mais tristes da minha vida.


terça-feira, 15 de abril de 2014

Karate


   Pois é, símbolos estranhos; não fosse o karate ter a sua origem numa ilha do outro lado do mundo. Isto aqui em cima é nada mais nada menos que a palavra "karate" escrita em japonês. É composta por dois caracteres, ou kanjis.
  • O primeiro kanji, 空, lê-se kara e quer dizer vazio, céu, vácuo.
  • O segundo kanji, 手, lê-se te e quer dizer mão.
   Portanto, karate é o estilo da mão vazia, no sentido em que não usa armas como outras artes marciais, nomeadamente o Iaido ou o Kendo, embora por vezes se façam uns treinos excelentes com o bo, um bastão de madeira mais comprido, grosso e pesado que um cabo de vassoura.
    Já agora, e mais em jeito de curiosidade, o kanji 手 tem a forma das linhas da mão...
 
    ... e já foi tudo ver se é verdade.



segunda-feira, 14 de abril de 2014

Apresentação

Um blogue sobre a prática de Karate… e eu que sei tão pouco… mas talvez por isso é que faça sentido começar agora.

Não queria que este blog se transformasse num diário mas sim num espaço de partilha e reflexão. Se quem já conhece o Shotokai achar piada ou conseguir relacionar-se com o que aqui for dito, ou se os que ainda não conhecem este estilo de arte-marcial ficarem minimamente curiosos, então ficarei felicíssimo, e tudo terá valido a pena.

Talvez agora um pouco sobre mim? Prometo ser breve.

A minha caminhada começou há pouquíssimo tempo, no dia 15 de Outubro de 2012, e já sinto mudanças profundas. Tenho a sorte de poder treinar com pessoas incríveis e todos os dias aprendo mais sobre mim, sobre os outros, sobre o mundo que me rodeia. Daqui a nada estou a fazer exame para cinto azul mas parece que foi ontem que entrei no dojo e disse com uma certa vergonha que gostava de começar a treinar.
   
O cinto branco passou a voar. Estar na segurança do canto, não saber para que lado me virar durante a saudação, o kihon junto à parede, interromper a aula com perguntas idiotas, rir-me parvamente de todas as técnicas que não conseguia fazer, o kumite em câmara lenta, e a minha mestra a insistir para nos afastarmos mais, as katas que eram mais coreografia que combate. E depois o exame, e os nervos que o acompanharam. Lembro-me especialmente bem do momento em que fui forçado a defender-me durante a viragem para não me magoar, e como isso me ajudou. No final superei a prova e o cinto mudou para amarelo.
E no amarelo vieram mais técnicas, mais desafios. Treinar mais baixo, a dor nas pernas, a distância no kumite a encurtar, ver colegas novos a chegar e outros a partir, e quando comecei a achar que percebia alguma coisa de Karate, chegar ao Estágio Internacional da Aroeira e ter os meus olhos abertos por pessoas absolutamente extraordinárias que me mostraram como o caminho é longo, misterioso e absolutamente fantástico.
E agora cinto verde. O redescobrir das técnicas, a subtileza do kumite, as amizades novas, os desafios diários, tanto físicos como mentais, o caminho a ganhar forma.

Tanto já se passou e tanto ainda está para vir.

Sinto que o Karate é um meio de auto-descoberta e construção espiritual. Muito mais que um desporto, é uma aventura que se vive com os outros, uma ligação entre discípulo e mestre, uma forma de conviver com o que nos rodeia. E numa época onde se dá tanto valor a objectos ocos acho que a prática de Karate faz mais sentido que nunca.


Espero que gostem do blogue, que se inspirem, e que me acompanhem nesta aventura de descoberta.

Dojo sede da Associação Shotokai Portugal


Não pus o significado dos termos técnicos de propósito. Seria uma pena abordar tudo logo no início.