sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Sintonizar o ideal

   O mestre exemplifica um pontapé e pede-nos para repetir. Nós repetimos, e ele diz:

"Não, não, mais baixo, assim expões-te muito."
 
   Tentamos outra vez.

"Não, assim não consegues avançar."

   E outra vez.

"Não, agora está novamente demasiado baixo, mas já está a ficar melhor."

   E outra vez.

"Pronto, estamos a chegar lá, mas agora é preciso lançar mais."

   Isto é o exemplo de uma conversa para ensinar a lançar um yoko-geri. O pontapé em si, aquele que tentamos alcançar, é um arquétipo, algo inatingível que toca a perfeição, e como temos ideia do que queremos, mas não sabemos ainda como lá chegar, vamos sintonizando o corpo para captar esse ideal, tentativa a tentativa, aproximando-nos cada vez mais, até que subitamente a música começa a fazer sentido e sabemos que estamos no bom caminho.

Sempre à procura do ideal.
  
 

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Emoções e Sentimentos

   Hoje em dia tratamos emoções e sentimentos como se fossem sinónimos, mas isto não é verdade. 

  • Uma emoção é uma resposta breve, intensa e involuntária. Como exemplos de emoções temos medo, raiva, alegria, tristeza, nojo e surpresa. As emoções também podem surgir na convivência com os outros, como é o caso da vergonha, da inveja, da simpatia, do orgulho ou da gratidão.
  • Um sentimento é uma reacção duradoura, subtil e consciente. Nesta categoria encontramos o amor, a coragem, a honra, a justiça, a confiança, o perdão, e tudo aquilo que faz de nós Humanos.

   Julgo que a interiorização desta distinção é essencial para o desenvolvimento de qualquer Karateca porque, se o que nos faz ir aos treinos são as emoções e não os sentimentos, mais tarde ou mais cedo a chama apaga-se, e acabaremos por desistir.

As cinco emoções básicas: alegria, raiva, medo, tristeza e nojo.
Embora todas façam parte do ser humano, não podem ser elas a guiar as nossas acções.
(Personagens do filme Inside Out)


   

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

O início do Caminho

   O início do Caminho é sempre difícil. Tentamos fazer coisas novas, em posições estranhas, sem qualquer noção da forma correcta de as fazer. E como poderia não ser difícil se a própria palavra nos diz que difícil é tudo aquilo que ainda não alcançámos?

   No início, tudo parece correr mal, o corpo dorido não quer obedecer e somos constantemente corrigidos pelo nosso mestre. Podemos carregar às costas todos os fracassos, ou podemos transformar cada erro num degrau, e usá-los para chegar cada vez mais longe. 

   Qualquer início é um desafio de humildade, de coragem e de entrega.

   No fundo, é como se fossemos exploradores de uma caverna escura, seguindo as indicações de um aventureiro mais experiente. Ele não pode percorrer o caminho por nós; pode apenas fazer os possíveis por se colocar no nosso lugar, vivenciando as mesmas dificuldades que nós, e procurando na sua experiência uma forma de as solucionar.

   Indicações para os aventureiros do Caminho:
  • Deves perguntar toda e qualquer dúvida. Certamente que não é tão parva como julgas.
  • Errar é a única forma de aprender, habitua-te a isso.
  • Segue as indicações cuidadosamente até descobrires o teu próprio estilo.
  • Vai com a mochila vazia. Preconceitos só te vão atrasar.
  • Confia no teu mestre, nos teus companheiros, e em ti próprio.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Chicotada

Mestre Tetsuji Murakami
   Por entre as muitas variações que as técnicas podem assumir, há sempre alguns princípios que nunca mudam. Um deles diz-nos que devemos ir à origem. De uma perspectiva tecnicista, isto faz todo o sentido. É mais eficaz defender um ataque que ainda não se manifestou, do que um que já ganhou força e velocidade e vai-nos partir os ossos se os metermos no seu caminho. Esta forma de pensar, a de procurar a origem, traz consequências interessantes. Primeiro que tudo, não dá lugar para movimentos largos e desnecessários. Tudo são linhas o mais rectas possível. Se o objectivo é atingir o alvo, ou o pontapé vai directamente ao seu encontro (como no mae-geri), ou então desenrola-se pelo caminho mais curto (como no mawashi-geri). E este desenrolar é como uma chicotada que trás uma força incrível.



quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Tsuki

   Tsuki (突き)  é o nome dado ao ataque básico no Karate. De punho cerrado, é uma estocada rápida como uma lança que parte do hara (centro), vai direito ao alvo e atravessa-o. No Shotokai, é recomendado que o punho seja o mais apertado possível, com o dedo médio flectido de forma a que o nó do dedo esteja ligeiramente mais protuberante que os restantes. Há quem deixe ainda o dedo indicador esticado para dentro da mão, de forma a impedir que os restantes dedos recuem no impacto.

O punho deve estar tão direito quanto possível, com a ponta do nó do dedo alinhada com o resto do braço pois qualquer inclinação fará com que ele se vire no impacto.

   Tsuki pode ser feito de mil e uma maneiras, com nomes tão inspirados como Yama-tsuki (tsuki montanha), ou Kagi-tsuki (tsuki gancho) porém, o mais importante não é tanto a forma mas sim o que está por trás.

   Um tsuki realmente eficaz é o que o próprio nome indica, uma estocada, e surge da fusão de dois opostos:

   Total relaxamento do corpo + Total concentração do punho

   Estaremos no bom caminho se compreendermos isto, mas, claro, depois faltará toda a componente energética, emocional, mental e espiritual. Sem isso, o tsuki não é um verdadeiro Tsuki, uma força que termina a violência e trás a paz.

Tsuki é uma estocada feita com uma lança imaginada.
 www.warriorway.net



sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Zanshin

   Imaginem-se numa festa de casamento com crianças a brincar e muita agitação. Enquanto contam as últimas novidades aos vossos amigos, uma criança tropeça, vocês agarram-na antes que se magoe e, sem quebrarem o raciocínio, continuam a contar o resto da história. O estado mental necessário para conseguir isto chama-se Zanshin (残心), a "mente restante", e é essencial para o Karate.

   Zanshin caracteriza-se por uma mente aberta, disponível, ligada a tudo. Para alcançar algo assim, é essencial começarmos por relaxar o corpo e serenar a visão. Os "olhos" da mente em zanshin não ficam presos pelas formas físicas mas vêem mais além, atrás, por cima, estão atentos a tudo. Em combate, é ela que nos permite enfrentar vários oponentes ao mesmo tempo.

Isto, por exemplo, não é zanshin. Se alguém surpreendesse o amável Daniel-san pelas costas,
provavelmente não se conseguiria defender.

   O estado de zanshin é próprio da mente superior, aquela que usamos para expressar os valores mais altos como o Amor e a Coragem. É por isso que ela não deve ser perturbada pelas preocupações que surgem na luta do dia-a-dia.
     
   Zanshin não é um conceito exclusivo do Karate, e existe em muitas outras artes marciais Japonesas como o Kyudo, o Kendo ou o Aikido. Por exemplo, no Kyudo, zanshin pode ser visto quando o praticante, após lançar a flecha, continua a acompanhá-la mentalmente através do alvo, para dentro da terra, até ao  infinito.

Largada a flecha, resta acompanhá-la até ao alvo.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Coragem


   Coragem e perigo costumam vir de mão dada - a coragem é aquilo que nos leva a enfrentá-lo, mas no mundo real, não costuma ser assim tão simples. Vejamos o exemplo no kumite. Colocamo-nos à frente do nosso oponente, relembramos a técnica, estamos atentos aos seus movimentos, e até podemos defender o ataque perfeitamente sem ter tido um pingo de coragem. Isto porque não tivemos que nos enfrentar a nós próprios. No kumite, a coragem vê-se nos pequenos pormenores, encarar com serenidade o olhar do oponente, manter a ligação com ele durante todo o combate, não apenas antes de ele atacar mas depois de defendermos.

   Coragem exige entrega, confiança, humildade e constância.

   É preciso imensa coragem para sermos verdadeiros connosco próprios, com o que sentimos estar certo, porque se fizermos isso, iremos inevitavelmente chocar com os outros. Como muitos já o disseram de maneiras diferentes "Se todos te adoram, algo está errado." Isto porque é impossível corresponder a todas as concepções que criaram de nós próprios.

   Coragem é o que nos leva a enfrentar o erro, não quem errou. É saber separar o pecado do pecador, e ter a humildade e a sensibilidade para destruir o pecado e deixar o pecador intacto.

domingo, 22 de novembro de 2015

Respiração

   É algo que fazemos constantemente mas, tal como comer, deve ser feito na medida certa. Respirar é uma das vias de entrada de energia no corpo e expulsão de dióxido de carbono. Quando as concentrações de dióxido de carbono aumentam, o sangue acidifica (pH < 7) e isto faz-nos querer respirar. É, portanto, o aumento de dióxido de carbono e não a falta de oxigénio que geram o impulso da respiração. Normalmente, este controlo é feito por uma parte primitiva do nosso cérebro (o tronco cerebral), mas nem sempre devemos confiar nele para tomar decisões porque ele não consegue prever quanto oxigénio vamos precisar antes de ser tarde demais.
   Quantas vezes estávamos a treinar e pura e simplesmente esquecemo-nos de respirar? Quantas vezes chegámos ao fim de uma série de pontapés completamente sem ar? Isto acontece porque só depois do pH no sangue baixar é que sentimos a necessidade de respirar. Claro que a solução é simples, tomar consciência do esforço e respirar de forma controlada antes, durante e depois. Mas, da mesma forma que respirar pouco dá-nos dores de cabeça e, numa fase extrema, afecta-nos a visão e faz-nos ver sombras em vez dos nossos companheiros, respirar demais põe a cabeça leve, dá formigueiros nas extremidades e é igualmente desaconselhado.

Uma das técnicas de respiração no Yoga.
   

sábado, 14 de novembro de 2015

Posicionamento estratégico

   Uma vez ouvi dizer que o sítio mais seguro para uma zebra é junto de um leão que acabou de se alimentar. Isto é estranho, mas se pensarmos bem, tem uma forte ligação com o que se passa no Karate. Colocar-nos à frente do oponente é perigoso, estamos a incitar um ataque e teremos que responder quando ele sair. Se o ataque vier, avançamos para o defender, mas se fizermos apenas isso, e pararmos à frente do oponente, não só não terminámos o conflito, como agora o mais certo é sair um segundo ataque com a outra mão, um pontapé ou até mesmo uma joelhada. É por isto que o lugar mais seguro não é o que se encontra longe do oponente mas sim o que está em cima dele, atento a ele, preparado para responder a qualquer ataque que, caso venha, não terá tempo de ganhar velocidade porque todas as linhas rectas que ele poderia percorrer estão bloqueadas pelo seu próprio corpo. Sem linhas rectas, os ataques têm de sair curvos, e isso retira-lhes eficácia.

Ainda que provavelmente seja montagem, continua a ser uma boa imagem.
   Esta ideia de fechar o vazio que existe entre nós é essencial durante o kumite porque, como já foi aqui dito, qualquer vazio poderá ser rapidamente preenchido por um ataque. E a melhor forma de anular um ataque é encontrá-lo na origem.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

União


   Tudo o que sobe, converge. Ou assim dizem os mestres. É por isso que não é tão importante o estilo da arte marcial praticada como são os valores do mestre que nos guia nesse caminho. Amor, Sabedoria, Serviço... Por mais diferente que seja o exterior, procuremos a união interior. Mas não nos percamos na ilusão de que devemos apenas subir, pois o que sobe também deve descer, ou ficará desequilibrado. É por isso que é tão saudável curvar-nos para limpar o chão do dojo, todos juntos, por um ideal comum. Basta isso, um acto conjunto, para dissipar os pequenos conflitos do dia-a-dia. E se vires os teus companheiros a limpar, junta-te a eles e limpa também. Limpa o chão e limpa-te a ti próprio, porque quem não transpira, conspira.

Crianças japonesas do primeiro ano escolar a limpar a sala de aula.


terça-feira, 27 de outubro de 2015

Treinar o invisível

   O dojo está cheio e o treino difícil. O sensei pede mais uma série de pontapés e subitamente apercebemo-nos que está a entrar frio, que o nó do cinto ficou mal feito, e os miúdos estão demasiado irrequietos. Talvez fosse melhor dizer a alguém para fechar a janela, ou ajeitar o cinto, ou parar para meter os miúdos na linha. Podemos fazer isso, claro, ou podemos aguentar e continuar. O stress aumenta, o cinto cai, os miúdos gritam, e ainda assim continuamos. Esta sensação que nos atormenta é idêntica à que sentimos durante um esforço físico intenso. É a mesma coisa, só que num plano que não vemos. Quando os músculos se queixam, sabemos que se continuarmos, estaremos a fortalecê-los; e o mesmo se passa com a mente. Quanto mais suportamos, mais conseguimos suportar. Até chegar ao dia em que estamos tão serenos que pequenas coisas como janelas abertas, cintos caídos e miúdos a gritar simplesmente já não nos afectam.


   Esta filosofia de procura do mestre em cada experiência é, para mim, essencial na prática de Karate:
  • Tudo o que te incomoda ensina-te a ter paciência.
  • Todos os que te abandonam ensinam-te a caminhar com os teus próprios pés.
  • Tudo o que te irrita ensina-te compaixão e perdão.
  • Tudo o que tem poder sobre ti ensina-te a recuperar esse poder.
  • Tudo o que odeias ensina-te a amar incondicionalmente.
  • Tudo o que temes ensina-te coragem para vencer o medo.
  • Tudo o que não controlas ensina-te a aceitar e largar.
(Frases traduzidas de um texto de Jackson Kiddard)

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Fugir ou Recuar

   Exteriormente, fugir e recuar podem parecer semelhantes; talvez se resumam a dar um passo atrás, mas, interiormente e consequentemente, não podiam ser mais diferentes.
  • Fugir está associado a medo, a evitar, a correr desordenadamente. Quando fugimos, pensamos apenas em nós próprios. Fugir implica uma quebra de ligação connosco, com os outros, com o quer que seja que nos assustou. Fugir é abandonar a esperança e confiar totalmente no lado mais inferior de nós próprios.
  • Recuar é um passo estratégico. Implica coragem e autocontrolo. Quem recua, enfrenta o medo - o medo que levaria outros a fugir. Recuar mantém a ligação com o outro. Quem recua mantém a esperança e abre caminho para um contra-ataque.

   Talvez a única semelhança que exista entre fugir e recuar seja que, quem teve de optar por uma ou por outra, nunca mais se esqueça da decisão que tomou.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Regressar

   O regresso aos treinos é sempre estranho. A insegurança face ao espaço, às pessoas, os nossos companheiros, mas ao mesmo tempo é tudo tão familiar, é como se nunca tivéssemos saído. O karate-gi assenta perfeitamente, o cinto ata-se sozinho. É bom estar de volta. O espaço é o mesmo, o cheiro a madeira, a vela sobre o tokonoma, a plantinha no canto, está quase tudo na mesma. Mas quem não está na mesma somos nós próprios. As técnicas que esquecemos durante as férias regressam naturalmente mas nem tudo está como antes. As memórias do que conseguíamos fazer não correspondem ao que de facto conseguimos fazer. Pelo menos não na primeira aula. Mas mais virão, e o Caminho continua.




domingo, 19 de julho de 2015

Lótus

 É quando estamos mais em baixo que temos a oportunidade de fazer o maior Bem. É nessas alturas em que só apetece fechar-nos dentro de nós próprios que devemos lutar por abrir o coração e chegar aos outros. Se fizermos isso, se mostrarmos coragem ao Universo, os astros alinham-se e coisas boas começarão a acontecer.

 Isto acontece porque as coisas não são apenas boas ou más. No mal existe o potencial para o bem. O bem é apenas o mal que foi trabalhado, da mesma forma que a flor de lótus é apenas a lama que recebeu a luz do Sol.

 Esta é a centésima publicação deste blogue. Tal como a flor que surge da lama, também ele nasceu num dia menos bom.

 Espero que tenham gostado. Que venham mais cem!

sábado, 18 de julho de 2015

Comparações

   Uma das melhores formas de nos iludirmos é com comparações.

   Comparando-nos uns com os outros...
  • Este é melhor que eu a nível físico mas eu sou melhor a nível mental.
  • Este tem mais flexibilidade mas eu tenho mais resistência.
    Ou comparando os outros...
  • Este é cinto azul mas é melhor que aquele cinto castanho.
  • Aqueles entraram ao mesmo tempo mas um tem claramente mais jeito que o outro.
  O problema desta filosofia é que em tudo o que nos lembrarmos, haverá sempre alguém melhor e alguém pior que nós. É natural que assim seja. O que não é natural é comparar e ordenar pessoas com caminhos e necessidades diferentes. Já para não falar que há efeitos negativos reais nesta forma de pensar:

   Acharmos que os outros são sempre melhores que nós traz-nos inveja e baixa auto-estima.
   Acharmos que os outros são sempre piores que nós traz-nos arrogância e egocentrismo.

   Devemos parar de fazer comparações, mas quando são os outros a comparar-nos com outras pessoas, o caso fica mais complicado. É nestas alturas que devemos centrar-nos em nós próprios e agarrar com força os nossos valores. Não somos melhores nem piores. Somos quem somos. Somos diferentes.

Cada uma, um indivíduo percorrendo o seu Caminho

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Separação Corpo-Mente

   Cada vez mais vivemos uma separação entre o corpo e a mente. Gastamos a vida a encher a cabeça com informação, a treinar para sermos suficientemente bons a executar determinada tarefa (mas não para a questionar) e esquecemo-nos completamente do corpo. É por isso que comemos o que faz mal mas sabe bem, sacrificamos a saúde em prol do trabalho, e vamos empurrando o exercício físico para quando houver tempo. Vemos o corpo como um veículo que apenas serve para transportar a mente e não como uma união corpo-mente-espírito capaz de tudo.


   Claro que depois há o outro extremo, igualmente mau, da adoração do corpo a descuido total da mente. Todas as fotografias no ginásio, todos os batidos de proteínas, todo o exercício desmedido são provas disso. Nem oito nem oitenta.

terça-feira, 14 de julho de 2015

Reflexo do mestre

   Quando Mestre Murakami encontrava um erro técnico num karateca, costumava perguntar quem era o seu instrutor, já que o mais certo era encontrar o mesmo erro nele também. Confrontando o instrutor, pedia-lhe que se corrigi-se já que estava a transmitir o erro aos próprios discípulos.
   

   Quer queiramos admitir, quer não, somos o reflexo dos nossos mestres, e há uma parte importante deles que vive em nós. É esta corrente dourada que nos une ao longo das gerações e nos aproxima dos nossos antepassados.

   Quanto estivermos a dar aulas, é essencial oferecermos o nosso melhor, pois não são apenas os alunos que beneficiarão do nosso esforço, mas os alunos que eles vão ter, e todos os outros que ainda estão para vir.



domingo, 12 de julho de 2015

Xadrez

   Existe uma semelhança clara entre kumite e xadrez.
  • Devemos mover-nos rápido para conquistarmos primeiro as posições no centro da batalha.
  • Tudo o que se afastar demasiado do centro perderá força.
  • Não podemos abrir a defesa ou será justamente por aí que o oponente entrará.
  • Temos que estar constantemente alerta para ataques inesperados.
  • É preciso pensar várias jogadas à frente.
  • Se avançarmos para um ataque de alto-risco, devemos assegurar-nos que é eficaz.
  • Inteligência e posicionamento vence a força.
  • A cada acção, o nosso oponente revelar-se-á.
  • Muitas vezes a melhor forma de terminar é com um empate.


sexta-feira, 10 de julho de 2015

Mitori geiko


   Existem muitas formas de treinar, e só por estarmos lesionados, não quer dizer que devamos ficar parados. Mitori geiko (見取り稽古) é uma forma de treinar que envolve a observação intensa e profunda do treino de outrem. Exteriormente é apenas isto, ficar parado a observar, mas o que se passa internamente é bem mais desafiante. Para melhor aproveitarmos o treino do nosso companheiro, devemos ligar-nos tão intimamente a ele que é como se fossemos nós próprios a executar cada movimento. Os erros dele são os nossos erros; as suas forças, as nossas forças. A ligação deve ser mental, emocional e espiritual. No final, é como se ambos usássemos o mesmo corpo e evoluíssemos com ele.



sexta-feira, 3 de julho de 2015

Repetição cega

   Diz-se que a repetição leva à perfeição, mas será sempre este o caso? Se não houver "alguém de fora" que oriente, mais tarde ou mais cedo surgiram erros que, através da repetição cega, acabaremos por incorporar. Para combater esta tendência, devemos estar constantemente atentos e com espírito crítico introspectivo, especialmente se já treinarmos há vários anos.

   Mais difícil do que corrigir alguém que errou, é corrigir alguém que errou mas, por já ter incorporado o erro, acredita estar certo.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Senpai

   Num dojo, existe o sensei, o senpai e os kohai. Dada a ordem pelo sensei, todos deverão segui-la em simultâneo, mas existe uma hierarquia que deve ser respeitada. Vejamos o seguinte exemplo: Se o sensei  pede uma kata onde temos dificuldade, é o dever do senpai ir ligeiramente à frente dos kohai, de forma a conduzi-los no caminho certo. Não deverá ir demasiado à frente e muito menos atrás. De certa forma, o sensei é a mente que coordena, o senpai, a mão que executa, e os kohai, o corpo que a segue. Shin Gi Tai. Primeiro a mente, depois a técnica e, por fim, o corpo.


   Ser senpai acarreta desafios novos. Não basta executar correctamente uma técnica, com todos os desafios que isso acarreta. Um bom senpai está disponível, atento, ligado tanto ao sensei como a cada um dos kohai, especialmente aos mais novos. Se quiséssemos andar e uma perna ficasse para trás, certamente que daríamos por isso. Assim deve ser o grupo que avança junto numa kata. Todos se movem em harmonia, e se alguém ficar para trás, o senpai deve ser o primeiro a abrandar o ritmo para que todo o grupo faça o mesmo, e quem ficou para trás os possa alcançar.

   O bom senpai não enfrenta apenas as suas dificuldades; ele enfrenta as dificuldades do grupo inteiro.


segunda-feira, 15 de junho de 2015

A importância da base

   Basta olharmos para as construções mais persistentes do passado para percebermos a importância de uma base sólida. Sem ela, não é possível subir aos céus e permanecer lá. E no Karate, passasse o mesmo. Podemos acumular técnicas e pensar que estamos a crescer rápido, mas ainda que isso seja verdade, o mais provável é estarmos a acumular erros também, e serão esses que, mais tarde ou mais cedo, nos farão ruir. A construção de um Karateca deve ser lenta e progressiva, com um regresso constante às bases: lavar o chão, treinar zenkutsu-dachi, kokutsu-dachi, as defesas básicas e, mais internamente, a humildade, o ego, o orgulho.
   Chamam-se básicas não por serem fáceis, mas porque é sobre elas que assenta tudo o resto. 



quinta-feira, 4 de junho de 2015

Mente acima da técnica.

   O adversário ataca e nós lançamos a mão para o receber, mas, por não termos saído cedo o suficiente, somos atingidos no braço ― um fracasso.  No instante seguinte, damos por nós a procurar falhas técnicas e como as vamos corrigir. Somos atingidos novamente e ficamos tão presos na técnica que nos esquecemos do essencial:

5. A mente acima da técnica.
一、技術より心術
Hitotsu, gijitsu yori shinjitsu

   Assim disse Gishin Funakoshi num dos seus ensinamentos.

   No kihon podemos repetir o mesmo movimento milhares de vezes, mas se no kumite não tivermos uma mente forte que nos empurre o corpo para a frente e nos impeça de vacilar, o mais certo é o combate estar perdido à partida.

   E como é fácil sabotarmos a nossa mente...

   Durante toda a vida, somos incentivados a classificar e a julgar; se está certo, então é bom, se está errado, é um falhanço. E os falhanços são tempo perdido pois apenas o sucesso importa. O problema que advém desta forma de pensar é que, se estamos a defender um ataque e algo corre mal logo no início, rapidamente classificamos toda a defesa como um falhanço, e esse estado mental quebra-nos a concentração e sabota não só o resto da defesa, como todo o combate.

Manter a concentração durante todas as etapas da acção pois, se nos desconcentrarmos, alguém sofrerá com isso.


terça-feira, 2 de junho de 2015

Corrente de antepassados

   Devemos caminhar com os olhos postos no futuro, é por isso que eles estão apontados para a frente, mas há instantes na nossa vida onde é importante olharmos para trás. A ligação com os antepassados é fundamental para podermos avançar firmemente. Sem ela, andamos a voar nas alturas sem nunca termos onde poisar. As nossas raízes, a nossa família, a nossa casa. É aí que pertencemos e, ainda que no coração tenhamos um sentimento mais global, nunca nos devemos esquecer de onde viemos.


   Nos dojos, costumamos encontrar fotografias dos mestres. Se puderem, tentem percorrer o caminho que vos une até eles e, se conseguirem, vão ainda mais além, e procurem os mestres dos vossos mestres. É reconfortante e emocionante pensar que praticamos o legado que eles nos deixaram e que, um dia, poderemos transmitir esse mesmo legado aos que nos substituirão.



domingo, 10 de maio de 2015

Presente no final

   "É importante estar lá no final."

  Foram estas as palavras ouvidas durante o treino. Estávamos a falar de pontapés, de controlar o movimento do princípio ao fim em vez de simplesmente atirar o pé para a frente e abandoná-lo no processo, mas, como sempre, a frase foi muito além do dojo.
   Quantos projectos de vida soubemos começar e quantos tivemos coragem de terminar correctamente? Estar presente no início é fácil, quando é tudo sorrisos e boa disposição, mas e no final, quando as dificuldades chegam umas a seguir às outras como vagas sem fim? Podemos fechar os olhos e fingir que somos mais precisos noutro lado mas a nossa consciência sabe melhor, e ficar e enfrentar será sempre melhor que fugir.
   Começar bem e terminar melhor, para poder começar outra vez. É por isso que temos que estar lá no final, nos pontapés assim como na vida.

terça-feira, 28 de abril de 2015

Treinar o limite

   Quanto mais tempo estivermos a treinar no nosso limite, mais evoluímos. Deslizar mais longe, lançar tsukis mais fundo, manter uma postura mais direita, baixar mais o hara. Há benefícios duradouros em estarmos constantemente no limite. Humildade, força de vontade, entreajuda. Devemos combater sempre os limites pois eles nunca param de nos reprimir.


   Os limites divergem de pessoa para pessoa por isso não devemos comparar-nos uns com os outros. Alguém com muita flexibilidade poderá estar a fazer um trabalho fraco ao lançar pontapés que toquem o tecto se o seu verdadeiro limite for muito além disso. Pelo contrário, alguém com verdadeiras dificuldades físicas poderá estar a fazer um excelente trabalho se estiver constantemente a treinar no seu limite, independentemente da altura dos seus pontapés. O segundo é um bom exemplo, o primeiro é só um bom espectáculo.

   O caminho do Karate passa por estarmos constantemente no nosso limite, a empurrá-lo sempre mais além, e quanto mais avançarmos, mais difícil será. É por isso que, passados muitos anos, devemos ter ainda mais vontade de progredir comparado com a que tínhamos quando usávamos cinto branco.
   

quinta-feira, 23 de abril de 2015

O vazio

   No kumite é essencial manter a ligação com o parceiro pois todo o vazio que criarmos será rapidamente preenchido pelo seu ataque. Este vazio pode ser tanto físico como mental. Quando é físico, manifesta-se numa abertura na nossa defesa, numa mão descaída, num ponto vital exposto. Quando é mental, sentiremos uma quebra de atenção, um respirar inseguro, o próprio medo de avançar.


   Para evitar que o ataque se manifeste, temos que impedir que este vazio se forme, ou seja, temos que mostrar ao oponente que estamos com ele de corpo e alma e que qualquer tentativa de ataque será imediatamente recebida por uma defesa tão pura que anulará o desequilíbrio que ele criou.

domingo, 19 de abril de 2015

Reencontro

   Já foi aqui dito que o caminho do Karate deve ser uma subida gradual e contínua mas, a verdade é que, por circunstâncias diversas, muitos são aqueles que se afastam. Falta de tempo, saúde, dinheiro, vontade, todos são motivos válidos. E se há muitos que se afastam, muitos haverá que encontram o caminho de volta ao dojo. Podem passar vinte, trinta, quarenta anos... não interessa. A necessidade que os fez procurar inicialmente o Karate agita-se novamente e fá-los regressar. E ver um companheiro regressar é das melhores sensações do mundo. Poder recebê-lo de braços abertos e mostrar-lhe como as coisas mudaram, apresentar-lhe os novos discípulos e, melhor ainda, ver que também ele continuou a evoluir fora do dojo e que está melhor do que quando partiu.


quinta-feira, 16 de abril de 2015

As Mãos da Mente

   A mente e as mãos são feitas da mesma matéria. Ambas são fortes, criadoras, rápidas a adaptar-se ao mundo que as rodeia. Quando a mente comanda as mãos e juntas trabalham em harmonia, tudo está bem. Mas é com o desequilíbrio que nos devemos preocupar.
  
   Se a mente for dominante, acabamos por não agir. Paralisamos sobre o peso dos nossos próprios pensamentos, enredados numa teia sem fim. Queremos tomar a decisão certa, a perfeita, aquela que não existe, logo, não agimos.


   Pelo contrário, se as mãos dominarem sobre a mente, a acção torna-se desmedida, perigosa para nós e para os outros. Em combate, podemos até ferir o nosso parceiro se não existir uma perfeita união entre as mãos e a mente.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Evolução no Karate

   Tudo está em constante mudança. As montanhas não estão onde começaram e até os desertos já foram outrora oceanos. Se nem as estrelas fogem a esta regra, como é que as técnicas no Karate podiam ser diferentes? Elas nascem, crescem e transformam-se com quem as pratica. Se tivermos o coração puro, elas evoluem em direcção ao seu ideal, mas deixemos essas alterações para os Mestres.

   As técnicas mudam continuamente, logo é natural que um dia sejamos confrontados com uma técnica que, apesar de ter o mesmo nome, é executada de forma diferente de aquela a que estamos habituados. Neste caso o melhor será sujeitá-la a uma avaliação profunda e imparcial para descobrir se é de facto melhor do que a que conhecemos, se cumpre os princípios, se gera a paz.

   "Existem muitos caminhos, e todos vão dar ao topo."

Praticantes de Karate a treinar num telhado no Japão,1934
www.historyoffighting.com/art-blog/tag/karate%20photography








domingo, 22 de março de 2015

Prana

   Segundo a tradição Indiana, prana é a energia vital que permeia todos os seres vivos. Há quem diga que o prana chega-nos através da respiração, que parte do sol, ou que é simplesmente algo que está intimamente ligado ao ser vivo. 

   Quanto tempo sobrevive uma pessoa sem comer? Nas condições certas, talvez quarenta dias.
   Quanto tempo sobrevive uma pessoa sem beber?  Talvez cinco dias.
   Quanto tempo sobrevive uma pessoa sem respirar? Uns três minutos, com treino talvez mais.
   Quanto tempo sobrevive uma pessoa sem prana? Um segundo, dois? Ninguém sabe...

  Embora todos sejam necessários, esta diferença revela uma ordem de importância que devia ser respeitada tanto na vida como no Karate.

   Se recebermos um tsuki duro como uma pedra, podemos magoar-nos, talvez até ficar com uma nódoa negra, mas não passará disso. Já um tsuki pesado como uma onda esmagando-se contra as rochas é capaz de nos atirar para trás e deixar-nos com falta de ar. Se ao tsuki de água juntar-mos a nossa respiração, expirando o ar e visualizando o ataque como uma espiral de vento, então começamos a ganhar uma perfuração que pode deixar danos físicos graves. Mas, se em cima disto tudo, juntar-mos o prana, aí sim, obtemos um tsuki completo e eficaz, capaz de atravessar o oponente e transformar o caos em ordem e paz. Ser atingido por um tsuki deste género deixa-nos confusos e desarmados, com a única convicção que não queremos continuar o combate.



quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Lado a lado

  O sensei chamou-me e pediu-me para ajudar uma companheira. Disse que podia fazer o que achasse melhor e largou-me à confiança. Eu, sem saber muito bem o que fazer, aproximei-me e coloquei-me ao lado dela, e ela pensou que era para continuarmos frente a frente, e eu voltei a mexer-me, e ela também, e corrigi-a com as mãos e com a voz, e ainda nem tinha começado o exercício já estava a dar-lhe um mau exemplo. Isto porque, se queremos realmente ajudar alguém, devemos seguir uma estratégia muito mais simples:

   Primeiro que tudo, temos que ligar-nos ao outro. Isto pode parecer complicado mas é na verdade muito simples. Deixemos as palavras por um instante e usemos os gestos e o olhar. Sim. Um simples olhar dizendo "estou aqui para te ajudar" é suficiente. No karate, ligarmo-nos com alguém muitas vezes dá a sensação que estamos a dançar com a outra pessoa, seguindo atentamente e imitando os seus movimentos.
   
   Segundo, temos que dar o melhor exemplo possível. Nada transmite melhor uma mensagem que uma acção, e se executarmos a técnica da melhor forma possível, com uma atitude e postura correctas, sem movimentos parasitas nem sorrisos inseguros, então é certo que a pessoa que tentamos ajudar aprenderá muito mais depressa.

   Se quisermos corrigir um pormenor, devemos fazê-lo de forma  simples e límpida. Se é preciso endireitar a postura do outro, então endireitamos nós a nossa postura de forma a que ele repare. Se queremos mostrar que a mão tem que sair antes do corpo, então podemos fazê-lo em câmara lenta, focando toda a nossa atenção na mão que sai.

   As palavras que usamos pouco ou nada acrescentam à mensagem que o corpo já está a transmitir. Ao falarmos, estamos a injectar na outra pessoa energia desnecessária.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Reformar

   À medida que crescemos, vamos adquirindo uma forma à qual passamos a chamar nossa. O problema é que esta forma foi moldada pelas circunstâncias do passado e tem tanto de nós como do acaso. Não escolhemos o país, a família ou o corpo em que nascemos, e tudo isso molda a personalidade mais do que a nossa própria vontade.

   Quando uma planta de casa não é rodada, o normal é crescer torta, virada para a janela mais próxima, com muitas folhas de um lado e poucas do outro. A solução neste caso é começar a rodá-la, mas as consequências do nosso desleixo continuaram. E se, em vez de actuarmos numa base defeituosa, pudéssemos reconstruí-la de raiz? É isso que o Karate pretende fazer.

   Todos os treinos procuram desfazer a forma em que nos tornámos e que foi sujeita ao acaso para a podermos esculpir de acordo com a nossa vontade, apontando sempre para o máximo das nossas capacidades.



segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Amigos, amigos...

   A amizade que mantemos com os nossos companheiros dentro do dojo pode muitas vezes virar-se contra nós. Se estamos a treinar lado a lado, a tentação para nos desconcentrarmos é grande, mas quando nos pomos frente a frente no kumite é ainda maior. Olhar um companheiro nos olhos e atacá-lo com intenção é difícil. Mais fácil será falar com ele, aligeirando o que de outra forma seria uma situação séria. O problema é que assim esquecemos que estamos a treinar para uma situação real onde o nosso oponente muito provavelmente não quererá falar connosco.

   Amigos, amigos... treinos à parte.

"Gigo" Funakoshi contra Shigeru Egami.

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Samurai


   Quando pensamos num Samurai, é normal imaginarmos um guerreiro poderoso com uma série de espadas capazes de cortar com precisão tudo no seu caminho. Embora isto não seja inteiramente falso, não é o que define um verdadeiro Samurai. Olhando para a raiz da palavra (侍士), veremos que Samurai quer dizer apenas "aquele que serve."


   Da mesma forma que um Samurai tem a técnica e a precisão necessárias para desembainhar uma katana e separar apenas um cabelo da cabeça do seu oponente, também tem a delicadeza e sensibilidade necessárias para fazer, por exemplo, Ikebana (生け花), ou arranjos florais.


   Se é preciso consertar as tábuas do dojo, o Samurai é o primeiro a fazê-lo humildemente, sem esperar recompensa e, de preferência, sem ninguém reparar (fazê-lo à frente de todos seria presunçoso). É este estado de alerta constante, tanto para limpar o chão como para derrotar mil inimigos, que define um verdadeiro Samurai.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Sorrir

   Há algo próprio do ser humano que, infelizmente, tendemos a perder com a idade. A capacidade de rir e brincar é própria das crianças, e é através dessa curiosidade e experimentação constante que crescem e aprendem tão depressa. Para elas tudo é novo e fascinante. Pelo menos até começarem a achar que já sabem que chegue, ou que não gostam, ou não querem saber. Porque será que a partir dessa idade vamos cristalizando até acharmos que já sabemos tudo o que alguma vez saberemos?

Shigeru Egami - Discíplo direto de Gishin Funakoshi
Morihei Ueshiba - Fundador e O-sensei de Aikido

















   
   A capacidade de encarar todas as acções não como sucessos ou fracassos mas como brincadeiras, ou seja, experiências necessárias para o nosso desenvolvimento é essencial para nos mantermos jovens e saudáveis.


quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Dissipar o ataque

O defensor é a cunha flexível que avança
 e dissipa o ataque do oponente.
   Em kumite, existem duas forças que se encontram. Elas podem chocar violentamente ou podem atravessar-se com pouca ou nenhuma resistência. Se uma delas assume a vertente Yang e decide "atacar", então a outra pode assumir a vertente Yin e decidir "defender." Para defender, ou seja, para travar o ataque antes de ele se manifestar, o ideal será adoptarmos a forma mental de uma cunha e irmos ao encontro do ataque, ali mesmo no centro do oponente, e obrigá-lo a dissipar toda a sua energia para longe de nós, deixando o seu corpo confuso e esquecido para trás.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Mushin

   Sempre que ocupamos a mente inferior com planeamentos e execuções, estamos a limitar-nos a fazer apenas isso - planeamentos e execuções - mas e se entretanto surgir algo inesperado? Algo para o qual não estávamos preparados? É por isto que o melhor é esforçar-nos por manter um estado mental aberto e desocupado por pensamentos e emoções. Se surge uma acção no oponente, mental ou manifestada, temos que nos adaptar simultaneamente para lhe dar resposta. E para isto ser possível, o estado de mushin no shin (a mente sem a mente) é fundamental.

Rochas em equilíbrio - www.gravityglue.com
   Para atingir e permanecer neste estado não podemos prender os pensamentos ou as emoções. Tudo tem de fluir naturalmente, como o vento, como a água. Encaremos os pensamentos e as emoções como nuvens que passam no céu. Podemos contemplá-las à distância mas não devemos prender-nos  a elas.

   Ao princípio, largar sensações parece difícil, aquela dor no pé durante o seiza ou aquela dor no joelho durante a espargata, mas eventualmente aprendemos a não lhes dar demasiada importância. Bem mais difícil parece ser distanciar-nos dos nossos sentimentos quando são eles que regem grande parte das nossas acções. Para isto, julgo que a única solução é compreender a sua fonte:

   Temos instinto;

   Temos mente inferior;

   Temos mente superior.

   E só as últimas podem vencer as primeiras.