terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Iluminar a escuridão (continuação)

   Medo leva à raiva. Raiva leva ao ódio. Ódio leva ao sofrimento. Mas, infelizmente, há uma altura onde é necessário combater fogo com fogo. Quando o ser humano perde toda a humanidade e fecha os olhos à razão, a Luz que emitimos não será suficiente para o fazer parar. Nesse instante é preciso um pouco mais: temos que ir bater à porta do coração.
   Para bater à porta, é essencial que não o façamos com raiva. Se nos afundamos com a pessoa que queremos salvar, então seremos dois a precisar de ajuda. E como é difícil travar uma situação extrema sem nos transformarmos naquilo que queremos travar. Para isso é preciso garantirmos que as nossas intenções são tão puras quanto podem ser. Qualquer ponta de escuridão crescerá dentro de nós e ficará para nos atormentar mais tarde. Mas não deixemos que isso nos impeça de agir. Se o nosso irmão ou irmã está em perigo, qualquer acção é melhor que a inacção. E nessa altura extrema, a guerra torna-se justificável.
  
Battering Ram - Jeff A. Menges

   Mas e depois de abrirmos a porta do coração?

   Aí é necessário iluminá-lo com toda a luz e calor que Deus tiver. Sem esta última parte, tudo terá sido em vão, e a escuridão continuará lá.
       

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Iluminar a escuridão

   Na vida somos muitas vezes confrontados com a escuridão, tanto dentro como fora de nós. Se ela provem do acaso, então paciência, tentamos preparar-nos melhor para a próxima e seguimos em frente; mas quando a escuridão é-nos imposta por outra pessoa, a solução já não parece tão simples. Somos subitamente invadidos por sentimentos de justiça, queremos mostrar à outra pessoa como está a ser incorrecta e como devia passar a agir no futuro. O problema é que mudar uma pessoa que não quer ser mudada é uma enorme perda de tempo. No fundo é como usar bombas para terminar uma guerra. Mesmo depois de acabar a última batalha, a guerra continua dentro dos "vencedores". E passa-se o mesmo numa discussão daquelas. A única maneira de vencer a guerra é com a paz, a indiferença com o amor, a escuridão com a luz. Podemos achar que é o nosso dever trazer a justiça à outra pessoa mas, se queremos realmente ajudá-la, devemos concentrar toda a nossa energia em estarmos bem, brilhantes, irradiando amor, ajudando humildemente tudo e todos. Como disse Confúcio, "é melhor acender uma vela do que maldizer a escuridão", e devemos acendê-la dentro do nosso próprio coração. Se fizermos isso, podem crer que eventualmente a luz chegará à pessoa que queremos ajudar.

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Defeitos em nós

   Estamos a treinar no dojo, olhamos para o lado e vemos o nosso companheiro demasiado inclinado para a frente. Ora, se descobrimos um defeito nele, não devemos ficar satisfeitos. Em vez disso, devemos olhar para nós próprios porque o mais certo é estarmos a cometer o mesmíssimo erro que ele. Isto acontece porque é preciso o defeito estar em nós para sermos sensíveis a ele. Por isso é que é preciso cuidado quando apontamos o dedo a alguém. O mais certo é termos três dedos apontados a nós próprios também.


   Esta ideia prende-se com o quarto ensinamento que Gishin Funakoshi escreveu: Conhece-te antes de conheceres os outros. E que trabalho imenso dá conhecer-nos a nós próprios. Principalmente porque o mais provável é não gostarmos muito do que vamos encontrar quando olharmos para dentro.

   "O quê, mas eu tenho todos estes defeitos? Ah não, afinal já não gosto de Karate, vou mas é praticar uma arte marcial diferente."

   "Pois, mas o que encontraste em ti próprio continuará lá, e a solução não é desistir mas sim corrigir a atitude, a posição, a técnica..."

   

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

T,T,T!

   A solução para todos os problemas dentro do dojo parece ser sempre a mesma:
   T, T, T, ou Treinar, Treinar, Treinar!
 
Sim, é assim tão simples.

   Aluno: "Quando é que estou pronto para exame? Quanto tempo demora até ao cinto preto? Porque é que nunca diz ao Manel para treinar mais baixo? Porque é que um menos graduado foi escolhido para dar-me aula?"
   Mestre: "TTT..."

   Mas atenção que é T T T e não T T T T T T T T T T T T T, ou seja, treinar todos os dias até à exaustão, sem nenhum período de reflexão pelo meio, também não é bom. O ideal é que a recta de evolução do Karate seja contínua, sempre a subir, com o mínimo de quebras possível. Evoluir muito rapidamente e depois desistir e esquecer tudo não serve de muito. Já dizia o Mestre Gishin Funakoshi: 

"Karate é uma busca vitalícia" e "é como água a ferver; sem calor volta a ficar tépida."

   Por isso tratemos de aquecer a nossa água gradualmente e quando virmos o fundo seco, pomos mais um pouco, e voltamos a aquecer.


quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Aprendizagem prática

   Quem já treinou num dojo no Japão poderá confirmar que eles raramente falam. Enquanto no ocidente, se queremos aprender, explicam-nos como é, no oriente, mostram-nos como é. Nós usamos a mente, eles usam a atenção e a intuição.

   Outra forma oriental de pensar é encarar o engano como parte imprescindível da aprendizagem, não como algo que deve ser evitado ou escondido a todo o custo. Ter medo de errar é meio caminho andado para não agir, e passar mais tempo a planear que a experimentar.

   Imaginem como seria o ensino nas escolas se ele fosse dado como no dojo:
  • Tudo o que aprendêssemos seria através da prática,
  • Sempre de acordo com a natureza própria de cada um,
  • Com a única intenção de nos enriquecer a alma.

   Se assim fosse, provavelmente não gastaríamos tanto tempo a decorar coisas que acabaremos por esquecer, só para sermos avaliados e ordenados consoante o nosso "valor académico", valor esse que, além de falso, pouca ou nenhuma importância tem na nossa vida quando começamos de facto a trabalhar.

Aula de Karate na India

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Uno e Completo

  Muitos dos problemas que temos hoje em dia surgem quando vemos o Mundo de uma forma errada. Isto deve-se ao facto do nosso cérebro, por algum motivo, adorar encaixotar e ordenar coisas. Ou está dentro ou está fora; ou é Portugal ou é Espanha; ou está vivo ou está morto, ou é dia ou é noite; ou é homem ou é mulher. O problema é que esta mente dual que nos rege não tem suporte no mundo real. O mundo não é preto e branco; nele estão contidas todas as cores do arco-íris. Nesta altura poderão haver aqueles que pensam que não é bem assim, que há coisas que ou estão ligadas ou desligadas: o famoso código binário de zeros e uns que rege os computadores, por exemplo. Mas se virmos bem, ele está baseado na electricidade, que quando vista de perto é tudo menos dual.

Um relâmpago visto em câmara lenta.

   Então se na natureza tudo é a manifestação de um espectro contínuo, porque é que haveríamos de pensar de forma diferente? Porque é que não concebemos a ideia de que existem "coisas" que não podemos ver porque pura e simplesmente não têm uma natureza dual? Porque é que não nos libertamos das ferramentas linguísticas que criámos para nos facilitar a vida e começamos a experienciar o mundo tal como ele realmente é: uno e completo.

rainbow-art.deviantart.com

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Dar e receber

   Parece fácil mas não é. Quando os excessos são tão óbvios, dar só ou receber sempre, a dificuldade está em encontrar o meio termo, o tal Caminho do Meio. Se somos tão generosos que só oferecemos, então não estamos a dar a oportunidade às outras pessoas de retribuírem, e isto gera um desequilíbrio que é mau para todos.

   Subjacente a esta ideia está o conceito de Yin-Yang. Se Yin é passivo e Yang é activo, há a tendência para pensar que Yang é superior, que domina sobre Yin, mas isto é falso. São os dois igualmente importantes e acontecem em simultâneo; a única diferença é que Yang toma a iniciativa. Se Yin não aceitar activamente, Yang não pode oferecer activamente. Sei que pode parecer confuso, mas basta imaginarmos duas pessoas a dançarem a valsa. Se avançam as duas, chocam e há desequilíbrio. Se recuam as duas, o resultado é semelhante, só que inverso. Mas se uma avança e a outra, em vez de avançar ou recuar, permanecer imóvel, gera-se na mesma um desequilíbrio.
   
   
Oferecer activamente <=> Receber activamente.

   Mestre Gishin Funakoshi disse num dos seus ensinamentos que não devemos esquecer a aplicação e remoção de poder, a extensão ou contracção do corpo. E isto prende-se com a nossa relação com o outro. Se ele está a ser Yang, a tomar a liderança no ataque, a falar, a ser activo, então podemos ser um pouco Yin, defendendo, escutando o que ele está a dizer, seguindo os seus movimentos, mas depois deveremos ser nós a assumir a vertente Yang, e ele deverá recuar para Yin. Desta forma fecha-se o círculo e formamos juntos o equilíbrio.